Amigos,
Mais uma vez o velho preconceito que os euro-estadunidenses formaram a respeito da mulher brasileira é explicitado... O pior é que o autor do livro nem conhece, ou leu, sobre o Brasil – segundo o próprio, comparando-se a Kafka, foi só por amor à arte (ou ao dinheiro)...
Romance lançado nos EUA trata o Rio como 'capital mundial do sexo' e causa indignação em Brasília
Plantão | Publicada em 27/08/2011
RIO - O americano Francis Levy é um bigodudo grisalho de 63 anos de idade que nunca esteve no Rio de Janeiro, nunca leu um livro ambientado na cidade nem nunca ouviu uma palavra em português. Diz que não conhece nenhum brasileiro pessoalmente e que jamais navegou pela internet para se informar sobre a vida dos cariocas. Mesmo assim, acaba de lançar nos Estados Unidos - com direito a uma pequena, mas elogiosa crítica do "New York Times" - um livro de 150 páginas intitulado "Seven days in Rio".
A obra - uma ficção que sai pela editora independente americana Two Dollar Radio, sem previsão de lançamento no Brasil - classifica a cidade como "a capital mundial do sexo" e a define como um lugar onde "o número de prostitutas equivale ao de ratos no metrô de Nova York". Num texto permeado por palavras e expressões chulas, relata os altos e baixos da estadia de Kenny Cantor, "um turista sexual convicto", em Copacabana e alerta para o fato de o Rio ser povoado por "batedores de carteira" e "gangues de sequestradores".
De Nova York, em entrevista ao GLOBO por telefone, Levy defende a obra:
- Meu livro remete o leitor ao universo da imaginação, do delírio, dos sonhos, exatamente como ressaltou o crítico do "New York Times" (Cameron Martin). "Seven days" não é uma obra realista, e digo isso logo no prólogo. Por isso, as pessoas não devem se aborrecer com seu conteúdo. E também não vejo problema em escrever sobre um lugar que não conheço. (Franz) Kafka fez "Amerika", uma maravilha da literatura, sem ter saído da Europa.
Ao saber do conteúdo de "Seven days in Rio", que custa US$ 16 no site da Amazon, a Subsecretaria de Enfrentamento à Violência contra a Mulher, órgão diretamente subordinado à Presidência da República, anunciou que pedirá retratação oficial - mesmo sendo uma obra de ficção.
Aparecida Gonçalves, que chefia a subsecretaria, promete acionar o Ministério das Relações Exteriores através de um ofício para que ele entre em contato com a embaixada dos EUA.
- O turismo sexual ainda não é uma página virada no Brasil - reconhece Aparecida. - Mas nós temos acordos bilaterais que versam sobre políticas públicas para mulheres firmados com Estados Unidos, Portugal, Inglaterra e Itália, e eles precisam ser respeitados. Nenhuma brasileira pode ser tratada assim, nem mesmo na ficção. E o governo de um país tem que responder pela atitude de seus cidadãos. Vamos cobrar isso deles.
Contactado pela reportagem, o Ministério do Turismo lamentou a publicação do livro e informou que não utiliza em sua estrutura a expressão "turista sexual". Por intermédio de sua assessoria de imprensa, explicou que, aos olhos do governo, o viajante que chega ao Brasil com o único objetivo de abusar sexualmente de seus cidadãos é encarado apenas como "criminoso".
Fundador de uma organização não governamental que até meados deste ano funcionava no New York Psychoanalytic Institute e que estudava a interseção entre a imaginação e a ciência, o autor de "Seven days in Rio" se define como um "humorista". Diz que usa a sátira ambientada no Rio para falar de psicanálise, instinto animal e consciência. Com um discurso veloz, repele a sugestão de que seu livro é machista ou preconceituoso com as mulheres brasileiras.
- Minha sátira não se limita a uma nacionalidade ou a um sexo. No meu imaginário sobre o Rio, construído, quem sabe, a partir de diversos cartazes turísticos que vi ao longo da vida e que mostravam mulheres em praias lindas, o Rio me parece um lugar paradisíaco onde eu, um homem careta, casado e pai de dois filhos adultos, poderia me perder. Não sou um pornógrafo, não faço uso de prostitutas e não tenho nada contra o Brasil. Só me permiti fantasiar sobre o Rio, meu Rio interior.
Durante os sete dias de sua estadia em Copacabana, o contador sexagenário de Manhattan Kenny Cantor se revela um nerd sem amigos, um homem que padece de fortes dores de cabeça, é traumatizado com a mãe e está em busca do que chama de a "verdadeira puta brasileira".
Para encontrar algumas delas, ele recorre ao eficiente Victor, que trabalha como concierge de seu hotel. O personagem, que fala mal inglês, comporta-se como um verdadeiro gigolô de luxo. Em uma das passagens em que aparece, envia uma prostituta ao quarto de Cantor enquanto pede à cozinha que providencie um prato de salmão grelhado para o hóspede.
Em um dos muitos momentos de reflexão de Kenny Cantor sobre a cidade e suas mulheres, ele divaga sobre o tamanho da calcinha brasileira: "Olhando de forma racional faz todo o sentido elas não taparem quase nada. Quando você quer vender alguma coisa, deve mais é mostrá-la."
- Kenny Cantor é um cara engraçado. Não apresenta risco algum para ninguém - defende Levy. - É um palhaço que vive situações surrealistas, como a de conhecer uma família de prostitutas aristocratas que se gabam da profissão. Ele não pode ser interpretado como um agresssor. Transa apenas uma vez.
Segundo o escritor americano, que foi comparado ao cineasta espanhol Luis Buñuel em uma crítica sobre o livro publicada no site de Chuck Palahniuk (autor da obra que deu origem ao filme "Clube da luta"), o objetivo de seu livro não é traçar um perfil do Rio de Janeiro, do Brasil ou de sua população, mas dar vazão à sua imaginação. Levy destaca, no entanto, que considera "normal" as pessoas não gostarem de ver ressaltados alguns aspectos de sua própria realidade.
- Aconteceu com Freud quando ele disse que as crianças tinham instintos sexuais - ele exemplifica. - E isso ocorre, sobretudo, quando o material em questão versa sobre instintos animais, da natureza, aspectos que nós do mundo moderno preferimos rejeitar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário