Amigos,
O livro Nas trilhas da representação - trabalhos sobre a relação entre a história, poder e espaço, organizado por mim, já está à venda na livraria da UFRN ou via remessa postal - edufrn@editora.ufrn.br
'Nas trilhas da representação' foi o resultado de uma experiência pedagógica conduzida na disciplina 'História, Poder e Espaços', do Programa de Pós-Graduação em História da UFRN, e estou postando abaixo a 'Apresentação' do livro para que vocês tenham uma ideia tanto de seu conteúdo, quanto de seu percurso, da sala de aula até a publicação.
O texto que abre o livro - 'Espacialidades
e estratégias de produção identitária no Rio Grande do Norte no início do
século XX' - é uma versão modificada do que foi publicado em 2010 na Revista de História Regional, espero que vocês gostem!
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APRESENTAÇÃO
Esta
coletânea reúne seis textos resultantes de um projeto levado a cabo no âmbito da
disciplina História, Poder e Espaços, durante o primeiro semestre de 2010, no Programa
de Pós-Graduação em História da UFRN, e que visava produzir textos a partir das
discussões engendradas por meio da técnica da leitura dirigida.
Para
que isto fosse possível, levamos em conta o perfil dos alunos que foi levantado
por nós na época mesma da Seleção do Mestrado, da qual participamos como membro
da Banca. Por meio deste perfil trabalhamos um roteiro de textos que visavam
não apenas apresentar propostas teóricas e metodológicas, mas também provocar
reflexões em torno de um problema que tocava a maioria dos objetos pesquisados
pelo conjunto do grupo. No caso, entendemos que o conceito de representação
necessitava ser embasado por formulações que permitissem a consolidação ou o
alargamento das hipóteses trabalhadas pelos mestrandos.[1]
Nossa
condução da leitura dirigida e do debate em grupo procurou, inicialmente, incentivar
a reflexão em torno dos objetos de pesquisa, para depois dirigir a apresentação
dos resultados obtidos sob a forma de produções textuais acadêmicas que obrigatoriamente
deveriam refletir sobre o conceito da representação. Nesse sentido, ainda que o
roteiro de leituras de nosso curso tivesse como base as ideias de Jacques
Derrida e as pensasse ao abrigo do 'pós-colonialismo', procuramos oferecer
subsídios para outras abordagens e deixar oportunidades para que cada um das leituras
pudesse ser rearticulada noutras visadas.
Visando
isto, colocamos em prática na sala de aula uma estratégia de divisão das
leituras dirigidas que consistia em fazer com que houvesse mais de um leitor
para cada leitura, no caso um leitor principal, responsável pela organização e condução
do trabalho de exame do texto, ajudado por dois leitores auxiliares, que
possuíam tarefas específicas em cada uma das leituras. Depois, os leitores
auxiliares se transformavam em leitores principais de outras leituras,
secundados por novos leitores auxiliares. Deste modo, facilitou-se o
desenvolvimento de visadas diferentes em cada leitura, uma vez que cada leitor
já havia sido testado em leituras anteriores. Para incrementar essa interação,
pensamos ainda um cronograma que impedia que os leitores apresentassem leituras
sucessivas, mas que planejava leituras alternadas, fazendo com que os grupos de
leitura se misturassem do início até o final do curso, de modo a possibilitar
uma articulação contínua em que o conjunto dos alunos acabou tornando-se
responsável por todas as leituras. Ao final de todas as leituras, reunimos os
alunos para discutir em conjunto a aplicação dos resultados das leituras sobre
cada um dos objetos. Depois, acompanhamos e orientamos as produções textuais
resultantes, selecionando ao final de tudo as mais pertinentes ao exercício. Assim,
foram estas as preocupações que possibilitaram manter a motivação do grupo durante
todo o nosso projeto, especialmente durante o exercício de produção textual, e que
acredito justificam a apresentação do esforço coletivo à publicação.
Mais
ainda, quero fazer notar que os trabalhos reunidos nesta coletânea não possuem
apenas uma unidade em torno do conceito da representação e da reflexão sobre a
relação entre história, poder e espaço, mas também com o debate do conceito de
cultura, conforme a tradição da escola alemã, trabalhada em nossa disciplina
nas leituras de Arthur Schopenhauer e Ernst Cassirer e, a partir do exame de
sua absorção por certa historiografia francesa, exemplificada pelas leituras de
Roger Chartier e François Hartog. Acredito que estas preocupações
teórico-metodológicas permitiram constituir uma unidade conceitual capaz de
justificar a publicação dos trabalhos aqui reunidos.
Deste
modo, a publicação desta coletânea visa, por um lado, contribuir para o campo
da metodologia de ensino superior, através da exposição dos resultados obtidos
com a técnica da Leitura Dirigida, por outro lado, oferecer novos estímulos
para o campo da História do Rio Grande do Norte e para a História dos Espaços,
por meio da apresentação de trabalhos norteados diretamente por estas
perspectivas.
O
primeiro destes trabalhos, Espacialidades
e estratégias de produção identitária no Rio Grande do Norte no início do
século XX, busca delimitar e delinear o problema da produção da
espacialidade e da identidade estadual, ao mesmo tempo em que aponta suas
possibilidades de investigação. Procuro discernir a ascensão e consolidação da
República como o marco cronológico inicial a partir do qual as organizações
familiares radicadas no Seridó, em Mossoró e na região de Natal começaram a
constituir discursos e narrativas centradas em suas articulações e interesses,
passando a formular e reelaborar continuamente a espacialidade e identidade
norte-rio-grandense.
Os
trabalhos Francisco Xavier de Mendonça
Furtado: expulsar, demarcar e governar e O marquês de Pombal e os sertões coloniais investigam a produção da
espacialidade e da territorialidade no período colonial, visando compreender os
mecanismos e as razões que conduziram as nomeações e interdições do
"outro" e a demarcação do território na América portuguesa. São textos
interessantes para aqueles que se interessam pelo exercício de pensar as
condições de investigação do espaço e dos territórios coloniais e sua relação
com o estudo da Capitania do Rio Grande do Norte.
Por
sua vez, o trabalho As representações da
escravidão e da abolição em Mossoró nas narrativas de Luís da Câmara Cascudo
procura entender e discernir as condições por meio das quais foi formulada e
constituída a relação com os afrodescendentes e a memória da escravidão na
historiografia norte-rio-grandense. É um texto intrigante por apontar os caminhos
para a crítica da história oficial e para uma reavaliação da obra de Luís da
Câmara Cascudo.
O
trabalho Reino encantado do Sertão
investiga as ligações entre história, literatura e espaço, visando entender a
produção literária de Ariano Suassuna como uma reelaboração da construção da
espacialidade e da identidade nordestina. A autora enxerga nessa relaboração o
'rastro' de articulações capazes de apontar e denunciar os interesses
envolvidos na costura do projeto pessoal de Suassuna com os interesses
conservadores.
Clarissimo speculo
bonitatis dei é o trabalho que fecha nossa coletânea,
perscrutando a fabricação de Francisco de Assis pela Igreja Católica e indicando
as condições que possibilitaram a sua transliteração para o campo amplo da ecologia.
Capim
Macio, novembro de 2010.
[1] Nosso roteiro de leituras foi
composto pelas seguintes obras: À Beira da Falésia, de Roger Chartier; O
Mundo como Vontade e Representação, de Arthur Schopenhauer; A filosofia
das formas simbólicas, de Ernst Cassirer; Gramatologia e A
escritura e a diferença, de Jacques Derrida; e O espelho de Heródoto,
de François Hartog.
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